Lula indica Messias ao STF; especialistas apontam lealdade política como critério principal
Em uma movimentação que acendeu o debate sobre a independência do Supremo Tribunal Federal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva indicou, na quinta-feira, 20 de novembro de 2025, o advogado Jorge Rodrigo Araújo Messias, 45, para ocupar a vaga deixada pela aposentadoria antecipada do ministro Luís Roberto Barroso. A escolha, anunciada oficialmente no Palácio do Planalto, não surpreendeu os observadores políticos — mas provocou um silêncio pesado entre juristas que esperavam um nome mais técnico. O que se viu foi um nome leal, consolidado, e profundamente alinhado ao projeto político de Lula. Afinal, não se trata apenas de preencher uma vaga no mais alto tribunal do país. Trata-se de uma mensagem clara: a fidelidade, hoje, pesa mais que o currículo.
Um currículo sólido, mas uma escolha política
Jorge Rodrigo Araújo Messias tem um perfil jurídico impecável. Formado em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), mestre e doutor em Direito Constitucional pela Universidade de Brasília (UnB), ele é um funcionário de carreira da Advocacia-Geral da União (AGU), onde atua desde 2006. Desde 2023, ocupa o cargo de Advogado-Geral da União, liderando um corpo de cerca de 6.500 servidores. Foi consultor jurídico da Presidência na gestão de Dilma Rousseff e, mais importante, foi o principal articulador jurídico da campanha de Lula em 2022. Seu trabalho na AGU incluiu a criação de núcleos especializados para combater desinformação — uma frente que, em tempos de polarização, ganhou peso estratégico.Contudo, como apontou o cientista político Leonardo Barreto, doutor pela UnB, "o critério utilizado foi o da lealdade, o da fidelidade, como na primeira indicação de Cristiano Zanin". E isso é o que realmente importa. Barreto não nega a competência de Messias — "ele tem um currículo muito bom" — mas lembra que, nos últimos anos, o STF deixou de ser um tribunal de juristas e se tornou um palco de alinhamentos políticos. "O critério agora é a lealdade e o alinhamento a projetos políticos", disse ele em entrevista ao Itatiaia.
A pressão da Câmara e o risco da partidarização
A indicação de Messias segue o rito constitucional: agora, o nome será analisado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal, sediada em Brasília. A audiência pública deve ocorrer dentro de 30 dias, conforme regulamento interno. Se aprovada pela comissão, o nome vai ao plenário, onde precisa de pelo menos 41 votos entre os 81 senadores para ser confirmado. O prazo limite para a votação é 31 de dezembro de 2025 — caso contrário, a vaga se encerra e o processo recomeça.
"Messias é um defensor público das posições do presidente", escreveu o jornalista Fábio Góes no Correio Braziliense. "Isso não é um defeito — é um fato." Mas, segundo Góes, é exatamente esse fato que preocupa. A escolha contrasta com indicações históricas como a de Eros Grau (2004), cuja obra acadêmica era reverenciada, ou Teori Zavascki (2012), conhecido por sua moderação e respeito à autonomia judicial. "Esses nomes eram escolhidos por sua autoridade intelectual. Hoje, são escolhidos por sua confiabilidade política", afirma o jurista André Ribeiro, especialista em direito político.
Por que isso importa para o Brasil?
O Supremo Tribunal Federal é, hoje, o principal eixo de equilíbrio do sistema político brasileiro. Decidiu sobre eleições, mandatos, reformas e até a própria sobrevivência de governos. Quando seus membros são vistos como extensões de partidos, a credibilidade do tribunal desaba — e com ela, a confiança da sociedade nas instituições. A Carta Capital revelou que Lula teve outras opções em mente, inclusive nomes mais técnicos. Mas optou por Messias por ser, segundo fontes internas, "um quadro leal, técnico e com formação jurídica sólida". A combinação é rara — e perigosa. Porque quando lealdade e competência se sobrepõem à imparcialidade, o tribunal deixa de ser árbitro e vira juiz do próprio jogo.
Além disso, a indicação vem em um momento de tensão. O STF já enfrenta críticas de setores conservadores e de parte da mídia por decisões que consideram "ideológicas". Agora, com a nomeação de um homem que atuou diretamente na defesa de políticas do governo — como a regularização fundiária na Amazônia e a expansão do Bolsa Família — o risco de ser visto como "tribunal do PT" aumenta. "Essa nomeação alimenta disputas ideológicas que fragilizam a autoridade institucional dos ministros", alertou o Correio Braziliense.
O que vem a seguir?
A batalha política não termina na CCJ. Senadores da oposição já sinalizaram que vão pressionar por uma análise rigorosa do histórico de Messias, especialmente em casos de disputa entre poderes. O senador Romário (PL-RJ) afirmou em rede social que "não vamos aprovar um ministro que serve mais ao Planalto que à Constituição". Já parlamentares do bloco governista, como Simone Tebet (MDB-MS), evitaram comentários, mas já se reúnem em bastidores para negociar apoios.
Enquanto isso, a sociedade civil acompanha. Movimentos como a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia já anunciaram campanhas de pressão pública. O debate não é mais sobre quem é mais qualificado. É sobre o que o STF representa: um tribunal acima das partes — ou um tribunal das partes?
Contexto histórico: quando a política entrou no STF
Em 2023, quando Rosa Weber se aposentou, Lula escolheu Flávio Dino — um nome com perfil técnico e histórico de atuação na magistratura. A escolha foi vista como um gesto de conciliação. Agora, a mudança de estratégia é clara. A indicação de Messias não é um acidente. É um novo paradigma. O governo quer um ministro que entenda o sistema jurídico, mas que também entenda que, em tempos de crise, a lealdade é o único capital que não se desvaloriza.
Isso não quer dizer que Messias seja ineficiente. Pelo contrário. Ele é um jurista competente, com formação acadêmica de ponta e experiência prática. Mas a pergunta que fica é: será que ele será capaz de decidir contra o governo, se necessário? E se a resposta for "não", o que resta do STF?
Frequently Asked Questions
Por que a indicação de Messias gerou tanta controvérsia?
Porque, embora Messias tenha um currículo jurídico sólido, sua trajetória está profundamente ligada ao governo Lula — ele foi articulador jurídico da campanha de 2022 e defende as políticas do Planalto na AGU. Especialistas como Leonardo Barreto afirmam que a escolha priorizou a lealdade política, não a imparcialidade, o que alimenta o medo de que o STF esteja se tornando um tribunal alinhado ao governo, e não ao Estado de Direito.
Qual é o processo para a confirmação de Messias no STF?
O nome de Messias será submetido à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, que realizará uma audiência pública nos próximos 30 dias. Se aprovado na comissão, o nome vai ao plenário, onde precisa de 41 votos de 81 senadores para ser confirmado. O prazo final para a votação é 31 de dezembro de 2025, sob pena de a vaga se encerrar e o processo ter de ser reiniciado.
Como Messias se compara a outros ministros indicados por Lula e Dilma?
Diferentemente de Eros Grau (2004), cuja obra acadêmica era amplamente respeitada, ou Teori Zavascki (2012), conhecido por sua moderação, Messias não tem histórico como juiz. Sua trajetória é de advogado público e assessor político. Isso o torna mais parecido com Cristiano Zanin, indicado por Lula em 2023, cuja nomeação também foi vista como recompensa por lealdade, e não por mérito jurídico tradicional.
Quais são os riscos para a democracia brasileira com essa indicação?
O principal risco é a perda da credibilidade do STF como árbitro imparcial. Se os ministros forem vistos como extensões do governo, decisões sobre eleições, direitos humanos ou crimes de corrupção podem ser interpretadas como políticas, não jurídicas. Isso enfraquece o sistema de freios e contrapesos e alimenta a desconfiança nas instituições, especialmente em um momento de alta polarização.
Messias tem alguma relação com partidos ou igrejas que possam influenciar suas decisões?
Sim. Segundo relatos do Jota.info, Messias é evangélico e membro da Igreja Batista em Brasília. Embora isso não o torne ilegal como candidato, especialistas lembram que, em outros países, a filiação religiosa ou política de juízes é questionada por risco de viés. No Brasil, ainda não há regra contra isso — mas o debate sobre conflito de interesses ideológicos está apenas começando.
O que acontece se o Senado rejeitar Messias?
Se a indicação for rejeitada, a vaga no STF permanecerá aberta até 31 de dezembro de 2025. Após essa data, o presidente poderá indicar outro nome, mas o processo começará do zero. A oposição já sinaliza que, caso Messias seja rejeitado, pode pressionar por um nome mais técnico — como o ex-ministro do STJ, Benedito Gonçalves, ou o jurista Luiz Fux (se retornar à vida pública).